
Toda a zona de Campanhã, Azevedo, Freixo e arredores eram, no século XVIII, uma extensa zona de campos e quintas. Estas zonas eram populares entre a alta sociedade tripeira para a construção de magníficos solares, casas apalaçadas, de campo, geralmente associadas a quintas onde eram cultivados os legumes e produtos hortículas que abasteciam diariamente os mercados e os estômagos da cidade. Assim nasceu o Palácio do Freixo, como muitas outras quintas e solares em redor do Porto (posso citar a Quinta da Prelada, a Quinta do Bom Sucesso, a Quinta de Bonjóia e muitas outras, tantas já desaparecidas de todo).
As Origens: os Távora e Noronha


Com a morte de D. Jerónimo, o palácio passou para um seu irmão, Vicente de Noronha Leme Cernache (1711-1799), cavaleiro da Ordem de Malta e embaixador da ordem junto de D. João V. Este casou com a sobrinha, D. Ana de Távora e Noronha Leme e Cernache (1730-1807), filha de Francisco de Távora e Noronha Leme e Cernache (1704-1738) e D. Leonor Quitéria Samúdio Sarmento (1713-?), filha de Francisco de Sousa Cyrne Soares de Madureira e Azevedo (dos Cyrne da Quinta do Cyrne, onde agora está a Junta de Freguesia do Bonfim).
Vicente de Noronha deixou a casa à filha mais nova D. Ana Rosa de Noronha Leme e Cernache (1779-1820). Esta filha já não usava o apelido Távora devido à perseguição do Marquês de Pombal a esta família. Veio a casar com João António Salter de Mendonça (1746-1825), 1º Visconde de Azurara, Fidalgo Cavaleiro da Casa Real, Comendador da Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, Conselheiro do Rei e Ministro do Reino. A partir de então a Quinta do Freixo incorpora os bens dos Viscondes de Azurara, mas por pouco tempo, já que o 2º Visconde, Jorge Salter de Mendonça (1804-1872), a vendeu por 15 contos de réis a António Afonso Velado, negociante de profissão que enriquecera no Brasil.
O Visconde do Freixo e as Moagens Harmonia.

No geral, as obras que empreendeu no palácio descaracterizaram completamente o seu interior, não se tendo privado de aplicar elementos novos como cimento e as lousas que até há poucos anos ainda revestiam parte das paredes exteriores. Nos jardins, projectados também por Nasoni (que tinha tido em conta as modas e as características do terreno inclinado, criando um jardim em escadaria para o rio) teve a ideia de instalar uma fábrica de sabão a poente do palácio. Gastou mais de 50 contos de réis.
Apesar de tudo, na sua mão, o palácio conseguiu recuperar uma aura de glória. Em 1872, quando a Família Real se deslocou ao Norte do país para inaugurar as obras da linha de caminho-de-ferro em São Roque da Lameira, António Velado, já Barão do Freixo (1865), quis receber as cabeças coroadas no seu palácio, e estas honraram-no com a sua presença. A festa desse dia foi tão sumptuosa e elegante que foi notícia no jornal O Comércio do Porto (nº 152) e D. Luís I elevou-o a Visconde.
Após a sua morte, a esposa viúva, Laurinda Lousada, vendeu toda a propriedade a Gustavo Nicolau Alexandre Peters, um burguês abastado de origem alemã. A fábrica de sabão deu lugar a uma destilaria de cereais, que viria a ser destruída por um incêndio em 1890. Mantendo a destilaria na sua posse, Peters vendeu a propriedade dividindo-a, a vários particulares, ficando o palácio para José Maria Rodrigues Formigal, que a vendeu posteriormente por 19 contos de réis à sociedade gestora da Companhia de Moagens Harmonia, que se instalou então numa nova fábrica, construída nem a dez metros das paredes do palácio. Os pisos de cima do palácio foram reservados à administração e secretariado, ficando o térreo a servir como armazém.
Regista-se então a saída de várias peças artísticas do palácio, vendidas e integradas hoje em outras propriedades. O portal principal da Quinta pode ser encontrado hoje a servir de entrada numa quinta em Vitorino das Donas (Ponte de Lima), a quem foi vendido em 1924. Apesar de ter sido declarado Monumento Nacional logo em 1910, a degradação do prédio continuou e de lá continuaram a sair peças, bem como a ser desenvolvida a fábrica à sua volta. Passou para a posse da Câmara Municipal do Porto, já em 1986, o que não levou a que o palácio, já terrivelmente degradado, fosse de alguma forma conservado, o que piorou com um incêndio que deflagrou no seu interior, provocado por marginais que viviam nas suas ruínas. Esse incêndio, bem como a intervenção das mangueiras dos bombeiros, destruiu os interiores por completo.
Que Futuro?
O palácio foi restaurado, finalmente, nos anos 90, no âmbito do projecto Metrópolis, com projecto de restauro de Fernando Távora, que foi concluído em 2003 e terá custado por volta de 2 milhões de euros. O restauro incluiu o arranjo do palácio, da envolvente, o desvio da EN. 108, que corria à face da fachada e a construção de um pavilhão de exposições que não chegou a ser construído. O restauro abrangeu o edifício das Moagens, que também é pertença da Câmara e iria albergar o Museu da Ciência e Indústria. O restauro merece nota positiva, até pela sua complexidade, comprovada na visita que fiz previamente a uma exposição sobre ele, patente na altura no Museu dos Transportes e Comunicações, em que observei vídeos e plantas que documentavam o restauro em detalhe.

Mais recentemente, o projecto de uma pousada para o conjunto foi aprovado pela Câmara. Ficou acordado, penso eu, que a pousada ocupará as Moagens Harmonia (contará com 70 quartos), ficando o Palácio com outras valências, possivelmente um restaurante, sala de estar e bar. O Museu da Ciência e Indústria passará para uma ala do edifício da Alfândega. A ligação entre o Palácio e o prédio das Moagens será coberta com uma estrutura em vidro. Os jardins serão visitáveis, num regime que não interfira com o normal funcionamento da pousada. Desconheço se o palácio gozará da mesma possibilidade.
A minha opinião:
O Palácio do Freixo é um imóvel de interesse inegável. Trata-se de um edifício rectangular com quatro torreões em cada canto, que lhe dão um notável sentido de verticalidade, num conjunto em que se destaca mais a horizontalidade, que caracteriza as casas deste género saídas da mão de Nasoni. Isto é, ele não era de fazer solares em que a altura fosse um elemento mais marcante do que a área. E era um adepto dos torreões, como se vê na Casa de Ramalde, mas o que torna o Palácio do Freixo espectacular é, antes do próprio palácio, a sua envolvente.

No entanto, quando visitei o palácio fiquei com a certeza de que ainda havia muitos arranjos a serem feitos. Na cozinha o reboco da parede já caía. As únicas casas de banho ficam no térreo, na antiga adega, e só por aí, a ideia de fazer os quartos da pousada no palácio parece-me risível. O restauro das pinturas e tectos está feito, pelo menos de forma parcial, mas parece-me que seria possível fazer algo mais, principalmente no tocante a lareiras e a frescos, de que penso ter visto vestígios.

No que toca aos jardins e exteriores, aconselho a colocação de fontes mais semelhantes às originais, ou a substituição por outro tipo de pedra, preferencialmente o granito, ou mesmo o bronze (que combinam mais com a antiguidade da casa). Recomendo ainda a colocação de buxo, roseiras, cameleiras ou árvores e arbustos de médio porte, tal como era o gosto dos jardins daquele género. Visitem-se os jardins da Casa de Mateus em Vila Real, saberão do que falo. Penso que um roseiral decorado com buxo e estátuas em bronze ou pedra seria uma ideia boa para o terraço frente ao rio. Aconselho o arranjo mais cuidado das balaustradas e escadarias, junto às quais podem ser arranjados bancos em granito ou madeira e floreiras, em cerâmica, bronze ou pedra. E ainda o aproveitamento dos terraços, guaritas e outros elementos decorativos do jardim, de forma a não os deixar transformados em urinóis de ocasião ou lar para namoricos mais ousados.

A Poente do Palácio deve ser construído um parque de estacionamento, não em terra batida mas optando pelo alcatrão, lajeado de granito ou uma camada de gravilha. O espaço pode ser alindado com uma ou uma cobertura arbórea que forneça sombra, graça e frescura ao espaço. Deve ser também promovida uma ligação directa e harmoniosa à Marina do Freixo e ao Museu da Imprensa. Tudo isto levará, penso eu, cerca de 20 anos a concluir. Surpresa? Porquê? Inclui as obras nos jardins e o crescimento das árvores! E não é fácil nem rápido arranjar bem arranjado o que esteve tantas décadas a estragar-se!

Para escrever este texto foram consultados:
IPPAR - Palácio do Freixo
Quintas de Campanhã
Geneall.Net - Fórum: Noronha e Távora e Távora de Noronha, do Porto
Lifecooler - Palácio do Freixo
Skyscrapercity - Fórum: Palácio do Freixo vai acolher Pousada de Portugal
Moagens Harmonia, Palácio do Freixo e Pousada
Belíssimo trabalho. Muitas horas de procura e investigação deve ter tido para encontrar estas datas e nomes. Acho o trabalho bem interessante para que todos aqueles que queiram saber algo mais da cidade que em que vivem ou que estão de visita. Forçaaaaaaa Continue
ResponderEliminarFilipe parabéns pela pesquisa e pela partilha. Gostaria de saber mais sobre este tema. A ser possivel, por favor entra em contacto tbcarpediem@gmail.com
ResponderEliminarOlá amigo, sou descendente de portugueses e já estive em tão bela cidade, como tb são acadêmica do curso de turismo, sei co mo é importante preservar a cultura de um país, de um estado ou de uma região, vc está d parabéns por tão bela cidade e país e por tão belo trabalho, amo valorizar estas coisas bjos fica na paz!!!
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